quinta-feira, 21 de outubro de 2010

Uma aula de física

Sinto um ambiente estranho. Estamos chegando à última semana de campanha eleitoral e, após as trocas de acusações e os novos escândalos que marcaram as semanas anterior e posterior a 3 de outubro, tudo estava surpreendentemente tranqüilo, sem nada de novo. Clima de conspiração. E eis que ontem acontece o episódio em que Serra é atingido por uma bola de papel na cabeça:(http://www.sbt.com.br/jornalismo/noticias/?c=1172). O episódio, flagrado pela câmera da reportagem do SBT, permitiu a Serra fazer uso eleitoral dos fatos de maneira mentirosa (basta ver os primeiros 40 segundos de vídeo: http://eleicoes.uol.com.br/2010/ultimas-noticias/multi/?hashId=corrida-ao-planalto-horario-eleitoral-da-tarde-de-2110-04021B3770C08993C6&mediaId=6910876), visto que é fisicamente impossível que um objeto pesado tenha colidido daquela forma com a cabeça do candidato.

Pois bem. Vejam o vídeo e tirem suas próprias conclusões. Sei muito bem do que estou falando, pois cursei física na Unicamp e o conhecimento necessário para estudar a trajetória deste objeto e sua colisão exige somente a física do colegial. É muito simples: um objeto abandonado no ar fica sob a ação exclusiva da gravidade e inicia uma trajetória parabólica, encontrando, em seu caminho, a cabeça de Serra. Devido ao choque, o objeto é desacelerado até parar (processo em que converte sua energia cinética em energia potencial elástica). Em seguida, ocorre o processo inverso: a energia potencial elástica é convertida em energia cinética e o objeto inicia uma nova trajetória parabólica, saindo da região coberta pela lente da câmera.

Pois bem, no momento da colisão, o que se esperaria? O objeto estava em movimento e a cabeça de Serra em repouso. Para ambas vale o princípio da inércia, segundo o qual o objeto tende a continuar seu movimento e a cabeça de Serra tende a continuar parada. Assim, o que aconteceria se um objeto pesado atingisse a cabeça? Por ter inércia maior, faria a cabeça de Serra entrar em movimento (o famoso "tranco"). No entanto, a cabeça do candidato não sai do lugar, o que indica que sua inércia é muito maior do que a do objeto, ou seja, trata-se de um objeto cuja massa é desprezível em relação à massa da cabeça. Uma bola de papel parece ser mesmo a hipótese mais plausível.

E com relação a machucar? Se fosse um objeto pesado, como afirmaram hoje no horário eleitoral gratuito, Serra teria uma cicatriz na cabeça. Onde está? por que ele não a mostra? Mais do que isso, o vídeo mostra fotos do candidato com as mãos sobre a cabeça, escondendo o local do suposto ferimento e fingindo sentir dor. As imagens do SBT deixam claro que, imediatamente após a colisão, Serra nem mesmo leva as mãos em direção à cabeça, se limitando a buscar com os olhos o objeto que o teria atingido, um reflexo, como quando alguém nos dá um tapinha nas costas. As fotografias dele com as mãos sobre a cabeça foram, portanto, tiradas depois do episódio.

O fundo está escuro, mas, aparentemente, os militantes do PT se encontravam, naquele momento, do lado oposto, e a bola parece ter vindo de dentro de uma loja. Pois bem. Restam duas questões: onde está o objeto, a prova do crime? Ele apareceu nas imagens, caiu no chão ali por perto e as pessoas ao redor de Serra deram sumiço nele ao invés de exibi-lo para as câmeras de TV? Muito estranho... E por que Serra não fez B.O. ou, pelo menos, um exame de corpo de delito para comprovar a acusação que faz aos militantes do PT?

O fato é que provavelmente Serra aparecerá diante das câmeras de TV, de hoje em diante, com um curativo na cabeça. Mas jamais se atreverá a arrancá-lo, para não gerar provas contra si mesmo. Quem viver verá.

No entanto, não duvido que façam um ferimento na cabeça de Serra para exibir na TV, pois, como dizia Maquiavel, "os fins justificam os meios", e a equipe de Serra segue essa cartilha à risca. Mas as imagens do SBT são uma prova incontestável de que é tudo uma farsa.

Em tempo: enquanto Serra se queixa de ter recebido uma bolinha de papel na cabeça, um militante do PT no AC foi assassinado covardemente por um eleitor de Serra: http://www.oestadoacre.com/index.php?option=com_content&task=view&id=5327&Itemid=1. Um voto a menos para Dilma.

2 comentários:

  1. Hoje saiu uma reportagem na folha dizendo que ele foi atingido duas vezes. Uma com bolinha de papel e outra com rolo de fita adesiva.
    De qualquer forma, voto não devia ser baseado no comportamento da militância, que age muitas vezes de forma impulsiva, como se estivesse numa partida de futebol, ou pior.

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  2. Concordo plenamente. É ridículo votar em um cara só porque ele foi vítima de uma agressão, independente de sua gravidade ou de seu autor. Um presidente deve ser eleito por seu mérito, não por ter sido vítima de hostilidade. Aliás, eis mais dois vídeos interessantes sobre o incidente:

    http://www.youtube.com/watch?v=LN2nlFkUdGU
    http://www.youtube.com/watch?v=LN2nlFkUdGU

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